sábado, março 24, 2012

Canção de embalar pelo filho

O caixão entrou na sala. A mãe aproximou-se do corpo do filho, agarrou-se a ele e começam a cantar-lhe uma canção de embalar.
O seu menino de oiro partira.
Quem lho iria restituir? Nunca mais o poderia embalar. Como vida é má, injusta e incompreensível. Porque lhe tiraram o filho?

quinta-feira, março 22, 2012

Apagar este dia do calendário

A igreja estava repleta, a rebentar.
Aqui e além, alguém fungava. Outros tiravam discretos os lenços de papel. Os óculos escuros serviam de refúgio, de máscara que escondia os olhos encarnados,
O pastor começou a sua homília:

- Todos nós aqui presentes gostaríamos de poder riscar este dia do calendário.

Ah, se fosse possível! Voltar atrás. Avisá-lo que nesse dia faltasse ao trabalho. Que estivesse mais atento ao atravessar a rua. Que não estivesse a mandar mensagens , que, que …..
Que importa? Não é possível voltar atrás. Não é possível riscar um dia do calendário.

- Parece que estamos a viver um pesadelo do qual queremos acordar.

Mas o pesadelo continua. Não é um sonho. É real. Não se pode voltar atrás. Uma palavra dita já não pode ser retirada. Um morto não pode renascer. Pelo menos aqui na terra, entre nós.
Que a morta estúpida, fora de tempo de um jovem de 20 anos nos ensine a todos, novos e velhos, a viver o dia o dia de modo a que não nos arrependamos dos nossos atos. Que não tenhamos que dizer:

- Ah, se eu soubesse isso…

Vivamos bem cada minuto da nossa vida. Pode ser que não tenhamos oportunidade de repor o que não fizemos. De remediar o que fizemos mal.

quarta-feira, março 21, 2012

Porquê, porquê, porquê?

A notícia veio de chofre.
- CS morreu no domingo. Atropelado. Ao ir para o emprego.
Lemos e relemos o SMS. Não podia ser verdade. Telefonámos a um amigo comum para confirmar.
- Sim, morreu. No domingo. Atropelado. Ao ir para o emprego.
Pensámos na mãe. O que e saber assim de chofre que o filho morreu. Sem se poder tr despedido. Sem o ver realizar os seus sonhos.
-Mãe, quando eu for grande quero ser….
Nada. Todos os sonhos ceifados pela raiz. 20 anos de sonhos terminados abruptamente ao atravessar a rua.
Morreu sem lhe ter dado um beijo especial de despedida. Sem o ter podido proteger.
- Adeus. Mãe, até amanhã…
…terá dito ao fechar a porta de casa para ir para mais um turno noturno.
- Adeus, até logo…
…terá dito a mãe.
Mas não houve até logo. Não houve até amanhã. Nem sequer um adeus houve. Foi-se. Para sempre. Um lugar vazio para sempre. Tudo o que iríamos fazer amanhã, depois de amanhã, no fim de semana, no verão. Nada se fará. Ao atravessar a rua, um táxi cortou pela raiz todos os planos, todos os sonhos. Toda a via.
E porquê?
Porque acabam assim de repente todos os sonhos?
Porque acabam assim de repente todos os planos?
Quem orienta o nosso destino? Porque é um jovem de 20 anos, a fazer 21 daqui a duas semanas teve de partir? Porquê, porquê, porquê?